Ontem cinco jogadores Chicago Bears e membros do comitê de justiça social da equipe junto com o presidente da franquia, George McCaskey publicaram um vídeo comentando pela primeira vez o fato de que os atuais jogadores negros da equipe serão os primeiros da história a efetivamente vestir um jersey que foi desenhado originalmente para a temporada 1936.
For our NFC North showdown this Sunday at Soldier Field we'll be wearing our classic jerseys for the first time since 1936.
Here’s an important message from our players and Chairman, looking ahead to Sunday. pic.twitter.com/SPbraNMFvL
— Chicago Bears (@ChicagoBears) September 25, 2019
Essa ação pode parecer em princípio uma estratégia gratuita da franquia, mas tudo indica que pode ter sido provocada pelo artigo do historiador Jack M Silverstein que foi quem primeiro trouxe o assunto à tona, num belo e completíssimo artigo publicado em agosto no site Windy City Gridiron. Poucos dias após o início da temporada, o Rev Jesse Jackson abraçou a história levando Silverstein para seu podcast e escrevendo sobre o assunto no Chicago Sun-Times.
Para os torcedores brasileiros, traduzimos o artigo original na íntegra, que conta uma importante e vergonhosa parte da história da NFL e a participação de George Halas neste capítulo.
THROWBACK: A VERDADE SOBRE GEORGE HALAS E A PROIBIÇÃO DE JOGADORES NEGROS NA NFL.
Quando os Bears vestirem seus uniformes retrô em alusão a 1936, eles estarão inadvertidamente fazendo uma homenagem aos 12 anos de proibição aos jogadores negros. O historiador Jack M Silverstein examinou este período e o papel de George Halas na sua origem.
Por Jack M Silverstein | 28/08/2019
Os Bears fizeram história neste verão sem se dar conta.
Aconteceu no evento de comemoração dos 100 anos em junho quando, para celebrar um século do futebol do Chicago Bears, a organização anunciou uma jersey retrô para a temporada de 2019. Uma jersey única na história dos Bears, ostentada apenas por um ano, em 1936. Ela é praticamente idêntica à outras jerseys que a equipe usou nos 1930 com uma diferença estética chave que são quatro listras em cada ombro.
O momento em que a história aconteceu foi quando Kyle Fuller e Tarik Cohen desfilaram os novos uniformes em frente à audiência do Donald E. Stephens Convention Center. Enquanto eram reverenciados pelos seus colegas de equipe e aplaudidos pelos torcedores, ninguém parecia saber para o quê estavam olhando: Fuller e Cohen foram, muito provavelmente, os primeiros jogadores negros a vestir estas jerseys.
Isso se deve porque 1936 foi a terceira temporada do período de 12 anos de banimento aos jogadores negros, para o qual nosso querido Papa Bear, George Halas, teve um papel fundamental.
Ao escolher essa jersey específica para esta temporada específica, o time nos convida a revisitar aquele temporada. Isso não aconteceu no caso de outros uniformes retrôs, que são inspirados em “eras” em vez de temporadas específicas. O retrô “Monster of Midway” – azul marinho com o laranja chapado nas letras e números – são promovidas como representantes da dinastia dos anos 1940, enquanto as jerseys laranjas são em homenagem às várias jerseys laranjas que o time usava esporadicamente nas suas primeiras quatro décadas. Até mesmo o outro jogo de uniformes retrô que os Bears usarão por um jogo nesta temporada estão atrelados a uma era: 1960, famosa pelo C branco no capacete.
Mas aquelas de 1936 com as quatro listras nos ombros – que usaremos contra os Vikings em 29 de setembro e contra os Cowboys no Thursday Night Football de 5 de Dezembro – são um caso único. Quando o desenho das camisas vazou, o ano original da jersey foi rapidamente identificado e incorporado aos tópicos da discussão.
You guys ready for these??
Our classic look is officially here for #Bears100. https://t.co/1IuMbo1iEr
— Chicago Bears (@ChicagoBears) June 8, 2019
“Nosso clássico uniforme na temporada centenária foi uma maravilha única de 1936,” disse o presidente George McCaskey no dia do lançamento. “Bronko Nagurski e seus colegas de equipe vestiram estas jerseys no caminho ao recorde de 9-3. Podemos apenas imaginar qual era a reação dos torcedores naquele tempo. Esperamos que os torcedores de hoje o apreciem, eles certamente vão comentar.”
A NFL não exatamente enterrou a história dos 12 anos da proibição. A liga conta esse capítulo num filme de 1994 “75 Temporadas: A História da NFL” e no artigo “A Reintegração da NFL” em seu website.
Mas a lacuna chave nas duas recordações são os nomes dos homens que lavraram essa escritura. A liga garantiu um único bode expiatório para um de seus períodos mais vergonhosos: George Preston Marshall, o dono do Washington Redskins, declarada e abertamente racista. Eu adotei a política pessoal de não publicar o nome do time de futebol de Washington, mas nesse caso é apropriado por conta do homem que efetivamente mudou o nome da franquia em 1933 de Boston Braves para Boston Redskins – para evitar a confusão com o time de baseball do mesmo nome.
A franquia dele foi a justamente última a adotar a integração de raças, o fazendo apenas em 1962 por causa de uma combinação de boicotes ativistas, matérias jornalísticas e uma ameaça do Departamento do Interior dos EUA de revogar o contrato de aluguel da equipe no Estádio do Distrito de Columbia (posteriormente o RFK) – e que para essas batalhas recebeu apoio do Partido Nazista Americano.
Assim, quando a NFL quer contar a história da proibição dos jogadores não-brancos entre 1934 e 1945, a liga tem seu bicho papão. E de fato, é de Marshall crédito de ter liderado o início do banimento numa reunião dos principais proprietários em fevereiro de 1933. Eu não tenho dúvidas de que ele o incitou, lutou por ele e o celebrou.
Mas Marshall era um filhote na época, recém chegado entre os donos, com apenas uma temporada da liga em seu currículo. Não havia como ele impor sua vontade aos proprietários das outras seis equipes representadas naquela reunião, juntamente com o presidente da NFL, Joseph Carr. Ele precisaria de um co-signatário.
E ele provavelmente teve vários. No entanto, eu apostaria que havia um aliado essencial de quem Marshall mais precisava. Ele seria o único homem que compareceu às duas reuniões, àquela na oficina de Ralph Hay, em Canton, Ohio, em 17 de setembro de 1920 – onde nasceu a NFL – e à reunião no Fort Pille Hotel em Pittsburgh, Pensilvânia, 12 anos e meio depois e a 127 quilômetros de distância, no dia 25 de fevereiro de 1933, onde nasceu a NFL segregada; o patriarca reinante da liga, então campeão e presidente do comitê de regras; amigo pessoal de Marshall: George Stanley Halas.
PAPA BEAR E A PROIBIÇÃO
As jerseys retrô de 1936 estão se mostrando populares. Vi muitos torcedores usando-as durante a transmissão do primeiro jogo da pré-temporada do time. As jerseys são promovidas num anúncio na parte superior da página dos Bears na loja da NFL.com, sendo a de Khalil Mack anunciada como a mais vendida. Suspeito que elas também estarão entre as jerseys mais populares dos Bears nos jogos e nos bares de 2019, as quatro faixas dos ombros imediatamente as distinguindo das brancas comuns.
A temporada de 1036 será uma das muitas que a equipe irá destacar durante sua temporada centenária, com os torcedores gastando mais tempo do que nunca revisitando a vida e a história de George Halas. E isso inclui a exclusão dos jogadores negros e uma pergunta óbvia: que papel teve Halas na criação e manutenção dessa proibição?
“O que torna a NFL tão única é que é uma liga completa e já começa integrada”, diz o professor, escritor e historiador Louis Moore, cujo trabalho inclui o podcast The Black Athlete. “O que você está apontando é uma amnésia histórica que temos.”
Desde a temporada inaugural da liga em 1920 até 1933, os jogadores negros não apenas jogaram – eles dominaram. O halfback All-Pro Fritz Pollard liderou os primeiros campeões da liga, os Akron Pros e, no ano seguinte, ele se tornou jogador-treinador. o Tackle Duke Slater estava entre os jogadores mais condecorados da liga no seu tempo, seis vezes All-Pro. O end Inky Williams, de Hammond, foi All-Pro em 1923. Dez anos depois, o último jogador negro em tempo integral antes da proibição, Joe Lillard, liderou seus Cardinals em jardas (totais, passadas e corridas) e pontos.
E então, de repente, todos sumiram. Não houve comunicado à imprensa. Nada por escrito. Ao longo dos anos, os proprietários envolvidos alegaram que nunca houve tal banimento. Halas, em particular, duas vezes deu desculpas esfarrapadas sobre o motivo pelo qual a liga teve jogadores negros por 14 anos e depois passou 12 anos sem eles. Em uma entrevista para o livro de 1970 “The Game That Was”, da apresentadora dos Steelers Myron Cope, Halas afirmou que não sabia porque os jogadores negros ficaram fora da liga por 12 anos, mas especulou que “provavelmente foi devido ao fato de que não houvesse grandes jogadores negros nas faculdades à época.” E reafirmou a Cope que não havia proibição, “de forma alguma”.
Em outra entrevista, em 1976, ao LA Times, Halas repetiu que não sabia por que a NFL teve 12 anos de futebol branco, mas pressupôs que “provavelmente, naquele tempo, o esporte não tinha apelo para jogadores negros. Provavelmente eles não perceberam as possibilidades do jogo na época.”
Nenhuma dessas afirmações se sustenta. Me parecem mais como uma distração deliberada ou um feliz esquecimento da parte de Halas. O primeiro – sobre o nível de talento dos jogadores negros na faculdade – é fácil de rebater, começando pelos halfbacks Oze “Ozzie” Simmons, de Iowa, e Kenny Washington, da UCLA.
A primeira temporada de Simmons na faculdade coincidiu com a primeira temporada da proibição na NFL: 1934. Sua estreia foi no dia 6 de outubro em Evanston, quando ele ganhou 304 jardas combinadas, correndo e retornando com um touchdown na vitória de Iowa por 20 a 7 sobre a Northwestern. Um escritor o descreveu, dias antes do jogo, como “notadamente o melhor corredor de campo aberto desde Red Grange.” O título foi ratificado após o jogo, com outro escritor o chamando de “o corredor que pode preencher o lugar de maior da liga depois de Red Grange.”
Em 1935, Simmons liderou Iowa em corridas e a Associated Press o elegeu para o primeiro time All-Big e para o segundo time All-America. Se ele tivesse nascido um ano antes e sem proibições, Simmons poderia muito bem ter vestido aquelas jerseys dos Bears com as quatro listras nos ombros. Em vez disso, depois que sua carreira na faculdade terminou em 1936, ele não entrou na NFL. Foi para o Patterson Panthers da American Association; em 1939, ele teve que receber uma licença de quatro meses de seu emprego no Departamento de Parques de Chicago para seguir jogando.
Naquele ano, o mundo conheceu Kenny Washington. Em 1939, sua temporada sênior, o halfback astro da UCLA Washington irrompeu um dos melhores anos do futebol universitário: liderou a NCAA em jardas totais e afirmou ter jogado 580 dos 600 minutos totais da UCLA. Mesmo quem não acompanhava a UCLA havia ouvido falar de Washington por conta de toda exaltação a ele na pós-temporada. Ele recebeu o troféu Douglas Fairbanks como o jogador de mais destaque no futebol universitário. A eleição do All-America se mostrou pouco confiável naquele ano (com Washington relegado ao segundo time da AP e da UPI, a despeito de seus recordes), mas em outra votação do All-America que contemplou 1659 jogadores universitários, Washington foi a única unanimidade.
Tudo isso teria aumentado suas chances de uma alta seleção no draft de 1940. Esse draft foi memorável para Halas. Foram draftados nove jogadores que ajudariam os Bears a vencer quatro campeonatos na década de 1940, incluindo dois futuros Hall of Fame (Clyde “Bulldog” Turner e George McAfee), outros dois futuros All-Pros (Lee Artoe e Harry Clarke) e o líder da franquia em recepções de touchdowns de todos os tempos (Ken Kavanaugh). Quatro desses jogadores (Turner, McAfee, Artoe, Kavanaugh) eram companheiros de Washington no All-America de 1939. Halas selecionou oito jogadores da posição de Washington, incluindo McAfee, Clarke e Ray McLean.
Em 22 rodadas de draft, no entanto, nem Halas nem nenhum de seus colegas proprietários selecionaram Washington, sem sombras de dúvida, o melhor jogador universitário de 1939.
Como é óbvio nos caminhos tomados por Simmons e Washington depois da faculdade, a colocação de Halas em 1976 – que o futebol não atraía jogadores negros nas décadas de 1930 e 1940 – também não se sustenta.
Primeiramente, não é como se os jogadores negros simplesmente tivessem apenas parado de jogar futebol. Nenhum dos dois jogadores negros da NFL antes da proibição deixou a liga por sua própria vontade: o tackle Ray Kemp da expansão Pittsburgh Pirates (que mais tarde se tornou o Steelers) foi liberado em outubro de 1933 no meio da temporada, re-assinou em novembro, terminou a temporada e nunca mais jogou na liga novamente. Enquanto isso, Lillard recebeu o bihete azul, apesar de ser o melhor jogador de um time moribundo do Cardinals que fez 1-9-1 naquele ano.
Os dois homens permaneceram no esporte. Lillard assinou com o Westwood Cubs de uma nova liga da Costa Oeste e passou por uma variedade de equipes durante cerca de uma década. Kemp foi para o Bluefield State College, na Virgínia Ocidental, como o novo treinador de futebol, o início de uma carreira de 39 anos como treinador e diretor atlético.
Estes eram apenas dois dos caminhos disponíveis para jogadores negros durante a proibição da NFL. Havia equipes totalmente negras, como os Brown Bombers que Pollard treinou e onde Lillard jogou por três anos. Havia times de all-stars, como o Chicago Negro All-Stars liderado por Slater, então aposentado.
E havia ligas alternativas, incluindo muitas integradas. Em 1939, Lillard se tornou o primeiro jogador negro eleito capitão de uma equipe integrada em uma liga principal, com os Union City Rams da American Pro Football Association. Um ano depois, a Liga de Futebol Profissional da Costa do Pacífico foi fundada, tornando-se lar dos astros negros da UCLA Washington, Woody Strode e Jackie Robinson.
A notícia dessas outras equipes e ligas não escapou a Halas. Não havia como. Em 1938, ele treinou os Bears em um jogo de exibição no Soldier Field contra um time de estrelas all-black, que incluía Lillard e Simmons em campo e Kemp como treinador.
Em janeiro de 1942, quando hordas de jogadores da NFL começaram a servir na Segunda Guerra Mundial, Halas declarou que o melhor futebol do país naquele ano seria nas ligas militares, incluindo sua alma mater, o Great Lakes Navy Blue Jackets em Waukegan. Dois anos depois de sua declaração, os Jackets foram liderados pelo astro e futuro Hall of Fame Marion Motley, que em 1946 se tornaria um dos quatro primeiros jogadores negros do futebol profissional após a proibição.
O primeiro deles foi Washington, que reintegrou-se oficialmente à NFL em março de 1946, quando assinou um contrato com o Los Angeles Rams, recém-saído de Cleveland. Como o já citado George Marshall que promoveu a integração de sua franquia apenas em 1962, o Rams integrou em 1946 também devido à pressão de organizadores, jornalistas negros e pelo direito de usar um estádio público. O ex-colega de Washington na equipe da UCLA, Strode, se juntou a ele em maio de 1946, e o Cleveland Browns da AAFC assinou com Motley e Bill Willis em agosto.
Essas duas contratações dos Rams terminaram com a proibição de 12 anos. No total, 29 jogadores negros competiram em quase 10 ligas integradas nesses 12 anos – incluindo Lillard, Kemp, Simmons e Washington. É um desafio à razão pensar que Halas, um mestre na avaliação de talentos que procurava jogadores em todos os lugares, não os conhecia, ou que ele olhou para a paixão deles e a interpretou como a de homens para os quais o jogo não “tinha apelo”.
MAIS DO QUE MARSHALL
Uma vez que a história dos jogadores negros durante a proibição da NFL é clara, mais duas perguntas sobre Halas vêm à tona. Primeiro, será que Halas alguma vez foi contra à proibição antes dela ser iniciada? Segundo, e mais importante: ele estava envolvido na origem da proibição em si?
Para a primeira pergunta, a resposta é sim, ele supostamente reagiu – mas seus esforços foram mansos, na melhor das hipóteses. Além de serem grandes estrelas nas faculdade, Simmons e Washington tinham outra coisa em comum: George Halas manifestou interesse em contratá-los.
“George Halas disse: ‘Ozzie, eu gostaria de usar você, mas temos uma regra não escrita na Liga Nacional, que é que os negros não podem jogar’”, disse Simmons ao Iowa City Press-Citizen em 1989.
Se parece difícil acreditar que Halas admitiria categoricamente a Simmons que a liga tinha uma regra não escrita de proibir jogadores negros, ele mais ou menos fez o mesmo com Washington em 1940. Naquele tempo o campeão da NFL jogava contra um time de all-stars do universitário antes da temporada seguinte. Em 29 de agosto de 1940, o jogo foi realizado no Soldier Field, quando o campeão Green Bay Packers jogou contra um time que tinha Washington, que marcou um dos quatro touchdowns e passou para mais um.
“George Halas me manteve por um mês tentando descobrir como me colocar na liga”, disse Washington em setembro de 1970, menos de um ano antes de sua morte. “Eu desisti antes que ele sugerisse que eu fosse para a Polônia primeiro.”
Não encontrei registro de Halas confirmando uma possível contratação, embora a história da NFL sobre a reintegração registre que “Halas tentou, sem sucesso, convencer os outros proprietários a suspender a proibição”. Isso me parece extremamente generoso com Halas, uma voz singular e pólo de poder na liga. Como treinador e proprietário de equipe, se ele quisesse violar a proibição, especialmente uma não escrita, não sei se ele teria que “convencer” alguém.
O mais difícil de convencer teria sido Marshall, a quem a proibição é largamente creditada. Como o biógrafo de Halas, Jeff Davis, escreve em seu livro de 2004 “Papa Bear”, Marshall “instou seus colegas proprietários” a perceber que, no meio da Depressão, com tantos torcedores brancos desempregados, os jogadores negros eram “ruins para os negócios”.
Mas em 1939, o argumento “ruim para os negócios” como forma da reação à depressão, já não era aderente. A liga estava em ascensão, quebrando a marca de um milhão de fãs na audiência. O desemprego em todo o país estava abaixo de 9.000 pela segunda vez desde a eleição de Franklin Roosevelt em 32, e logo cairia vertiginosamente quando os EUA entrassem na guerra e os americanos entrassem no serviço militar.
Então, talvez Halas não tivesse mesmo sido capaz de convencer seus colegas proprietários – em meados da década de 1930 – a deixá-lo assinar com Simmons. Mas se ele realmente quisesse assinar Washington ou, francamente, qualquer outra estrela negra, acho que ele poderia tê-lo feito.
Isso levanta uma questão paralela: por que ele não o fez? Digamos que, entusiasticamente, de má vontade ou de forma calculista, ele concordou com a proibição em 1933. Ele não necessariamente sentiria o mesmo em 1939 e 1940. Ele viu Kenny Washington jogar. Ele, que era um mestre da vantagem competitiva, especialmente na aquisição de jogadores. Ele, que assinou com Paddy Driscoll dos Cardinals para o campeonato de 1920 contra as regras da liga. Ele, que contratou Ed Healey dos Rock Island Independents em 1922 por absurdos US$ 100. Ele, que liderou a controversa contratação de Red Grange em 1925 enquanto o halfback ainda estava na faculdade.
“Colocamos por escrito”, escreveu Halas em sua autobiografia de 1979, sobre o acordo com Grange.” A última cláusula dizia que se algum de nós fosse perguntado sobre um contrato, declararíamos que não existia. (…) Tentamos manter nosso acordo em segredo (…)”
Então não, Halas não era avesso a perseguir agressivamente jogadores, ou até mesmo alterar as regras e costumes da liga para fazê-lo. Pense no backfield dos Bears dos anos 40. Só os nomes dão arrepios aos adversários. Luckman, McAfee, Gallarneau, Nolting, Standlee, Famiglietti, McLean. Você consegue imaginar Kenny Washington nesse grupo? Halas, que fervia de raiva por ter sido “roubado” no título de 1920, como ele achava, teria o título de 1942 e um tetracampeonato entre 1940-1943. Esqueça 73-0 – teríamos marcado 100 pontos na final de 1940.
O que nos leva à pergunta final e mais importante. Qual foi o papel de George Halas na criação do banimento? E, novamente, embora não existam evidências concretas para mostrar que ele ajudou a lançar esta política, parece impossível pensar de outra maneira.
A reunião de proprietários de 1933 ocorreu no auge da Depressão, e a NFL não estava imune. Os Bears venceram o campeonato de 1932 e ainda assim perderam US$ 18.000. Halas teve que tomar uma série de empréstimos pessoais apenas para manter o controle do time.
Mas o esporte e a liga também eram intrinsecamente falhos. Por isso, o presidente do comitê de regras, Halas, uniu forças com o proprietário recém, Marshall, para liderar uma série de mudanças importantes nas regras, na esperança de aumentar a pontuação, o interesse dos torcedores e os ingressos.
“Concluí que estávamos jogando um futebol maçante”, escreveu Halas em sua história de 20 partes, em 1967, do Chicago Tribune. “Propus algumas mudanças radicais e – com o apoio entusiasmado de George Marshall, proprietário do Washington Redskins – garanti três revisões urgentemente necessárias para a temporada de 33”. Essas regras incluíam as hash marks no gramado para impedir que as equipes ficassem presas à linha lateral após uma jogada para fora do campo e movi os postes do gol para a linha de gol, em vez da parte traseira da end zone para criar field goals mais curtos.
Halas e Marshall trabalharam bem juntos. E eles eram amigos. Quando os proprietários e o comissário da liga posaram para uma foto, os dois homens ficaram lado a lado, com o braço de Marshall em volta do ombro de Halas. Halas escreveu que Marshall era “o promotor mais astuto e o maior falador desde Charles C. Pyle”. Este era um grande elogio, pois Halas certa vez chamou Pyle – agente de Grange da Universidade de Illinois – um homem de “visão ilimitada.”
Tudo o que aconteceu naquela reunião de 33 aconteceu por causa de Halas e Marshall, incluindo a proibição.
No entanto, uma análise mais profunda do número de jogadores negros na NFL mostra que a queda não era apenas sobre a Depressão. Nem sobre George Preston Marshall. Há uma clara ruptura entre as temporadas de 1926 e 1927.
Olhando dessa maneira, a “era da pré-segregação” é vista não como uma era, mas duas:
Por mais fortes que sejam esses números, eles se distorcem ainda mais por conta do grande Duke Slater. Ele é o único jogador que aparece nessas duas épocas, tendo jogado de 1922 a 1931. Remova-o e o grupo de 1927-1933 cai para quatro jogadores com seis temporadas de experiência.
Neal Rozendaal, escritor, historiador e biógrafo de Duke Slater também notou isso. Em seu excelente ensaio de duas partes, “The Myth of the NFL’s Color Ban”, Rozendaal observa que os times que contrataram jogadores negros nos primeiros sete anos da liga eram principalmente clubes de mercados pequenos. Pollard jogou em Akron, Hammond, Milwaukee e Providence. Williams esteve em Canton, Hammond, Dayton e Cleveland. Até 1926, Slater jogou pelos Rock Island Independents com exceção de uma temporada.
“Eram as equipes desesperadas de pequenos mercados, as equipes que precisavam de talentos para competir em campo e de bilheterias para sobreviver, que contrataram a maioria dessas estrelas afro-americanas”, escreve Rozendaal.
A mudança ocorreu durante uma reunião da liga em julho de 1927, com a liga em “desordem”, escreveu Halas. Para “separar os homens dos meninos”, o Presidente Carr exigiu que todas as equipes pagassem US$ 2.500 para garantir vaga na próxima temporada. Essa mudança ajudou a reduzir a liga de 22 para 12 equipes, eliminando muitos dos clubes pequenos e limitando as oportunidades para jogadores negros.
Em 1933, a liga estava reduzida a Kemp e Lillard. A proibição, liderada por Marshall, apenas codificou uma tendência que ganhava força desde 1927, cinco anos antes de Marshall e seu grupo lançarem a franquia de Boston e dois anos antes do mercado de ações falir. A história se lembra dele como líder. E ele tinha muitos facilitadores que eram igualmente importantes.
“O perigo de dizer ‘bom, eles eram homens de seu tempo’, é que isso nos permite ignorá-lo e não lidar com as consequências”, diz Moore. “Eu acho melhor dizermos: ‘essas pessoas são cúmplices’. (…) Se não atacarmos as pessoas que deixaram isso acontecer, apenas permitiremos que as pessoas continuem fazendo isso. Não me importo com a época: responsabilize as pessoas.”
Dos 11 homens que compareceram à reunião de 1933, cinco foram homenageados na classe inaugural do Pro Football Hall of Fame em 1963: o presidente da NFL (Joseph) Carr, os proprietários de equipes Curly Lambeau dos Packers, Tim Mara dos Giants, Marshall e Halas. O Dr. David Jones, do Chicago Cardinals, vendeu sua franquia antes da temporada de 1933 para outro participante dos primórdios do Hall: Charles Bidwill, da classe de 1967.
A NFL também adicionaria três franquias em 1933, duas das quais foram lançadas por Bert Bell (classe de 1963) e Art Rooney (classe de 1964). Esses oito homens – Bell, Bidwill, Carr, Halas, Lambeau, Mara, Marshall e Rooney – lideraram a liga em várias frentes durante quase toda a proibição de 12 anos. Com exceção de Marshall, cada um deles é reverenciado na história da liga. Vários recebem o mesmo respeito por sua respectiva franquia como Halas recebe aqui. Em 2019, os Cardinals, Bears, Giants e Steelers são de propriedade ou co-propriedade das mesmas famílias que os possuíam em 1933. O nome “Lambeau” evoluiu para iconografia. Bert Bell tem um prêmio MVP com seu nome.
Cada um deles foi fundamental para a proibição. Um artigo de 1988 da Pro Football Researchers Association atribuiu a responsabilidade a Marshall, Halas e Rooney, acrescentando que Carr a sancionou. Lambeau a apoiou – os Packers não integraram até 1950, meses depois que ele deixou a franquia. Bell a apoiou – os Eagles não integraram até 1952, 12 anos depois que ele deixou a franquia. Pollard atribuiu a Mara e Halas; os Giants da família Mara não integraram até 1948, enquanto os Bears de Halas não integraram até 1952.
“Ele, junto com a família Mara, começou a rolar a bola que acabou levando ao banimento dos negros”, disse Pollard sobre Halas em 1971.
E depois há Bidwill e Rooney, que liberaram os dois últimos jogadores negros da liga antes da proibição. Em ambos os casos, os proprietários se esquivaram da responsabilidade ao dizer que foi uma escolha de seus respectivos treinadores. Quando os Cardinals de Bidwill dispensaram Lillard, o técnico Paul Schissler declarou em 1935 que Lillard precisava sair porque sua própria presença fazia dele não apenas um “homem marcado” entre jogadores brancos, mas que fazia dos Cardinals uma “equipe marcada”.
“Como o resto da liga jogou isso sobre nós!”, Relatou Schissler ao Brooklyn Daily Eagle . “Tivemos que deixá-lo ir, por nossa causa e por ele também!”
Lillard, então membro da equipe negra Brown Bombers, zombou disso: “A liga profissional e a maneira como eles devem lidar com os infortúnios, é uma piada”, disse ele. “Ora, nunca me machuquei nos profissionais como fiz quando estava na faculdade. É um negócio na liga, e eles deixam estar.”
Quanto a Rooney, ele deixou seu treinador racista Jap Douds tomar a decisão de cortar Ray Kemp. “Art Rooney era um homem de absoluta boa vontade”, disse Kemp em 1978. “Mas ao longo dos anos, Rooney deu total autoridade aos seus treinadores. O treinador não me queria naquele time, então eu fui demitido.”
Pollard afirmou, no dia da sua morte, que Halas lhe tirou as oportunidades da liga. Os dois homens compartilham uma história. Eles nasceram em Chicago, com um ano de diferença. Eles eram inimigos no ensino médio e pioneiros da NFL. De acordo com Pollard, depois que suas equipes empataram sem pontos no campeonato de 1920, levando o Akron de Pollard a se tornar campeão da liga, Halas parou de agendar jogos dos Bears contra as equipes de Pollard.
“George Halas me usou para conseguir tudo o que podia”, disse Pollard em 1976. “Depois que ele me usou e conseguiu poder, ele levantou a barreira do preconceito. Se George Halas ainda fosse hoje como ele era na época, ele não permitiria um jogador negro em Chicago porque era preconceituoso como o inferno. ”
“Ele é um mentiroso”, respondeu Halas no mesmo artigo. “Em nenhum momento a cor da pele importava. (…) Se você tivesse sangue vermelho, você me tinha.
Ainda assim, o fato é que os Bears de Halas não tinham jogadores negros antes da proibição, não contestaram a proibição e tiveram outras seis temporadas após a proibição antes de receberem um jogador negro. A aplicação da proibição não foi o ato de um homem. Nunca é.
“É um tapa na cara quando eles sabem que são bons o suficiente”, diz Moore. “E acho que isso faz parte da história da América Negra. Você sabe que é bom o suficiente, mas não tem a oportunidade porque é negro.”
***
“Se George Halas ainda fosse hoje como era na época…”
Essa declaração de Pollard se destaca para mim.
Porque a história não é tão simples. Se Halas não mudou no espírito, ele certamente se ajustou na prática. Ele também estabeleceu critérios raciais que conduziram a liga para um futuro melhor.
Em 1949, o Bears de Halas se tornou o primeiro time da NFL a draftar um jogador negro, escolhendo George Taliaferro, da Universidade de Indiana. Taliaferro nunca jogou no Bears – ele acabou assinando com o LA Dons – e o Bears finalmente integrou em 1952, draftando o halfback Eddie Macon, da Universidade do Pacífico.
“Quero que você seja meu Jackie Robinson”, Macon lembrou, em 2005. Halas dizendo a ele em 1952.
Um ano depois, Halas trouxe Willie Thrower, o primeiro quarterback negro moderno da liga. Mais tarde, Halas abriu caminho quando designou a primeira dupla interracial de companheiros de quarto da liga em um training camp, com Gale Sayers e Brian Piccolo.
“Ele era apenas um grande homem”, Sayers escreveu sobre Halas em seu prefácio na biografia de Davis. “Ele fundou a Liga Nacional de Futebol Americano e a conduziu através da Depressão e tudo mais. Apenas um grande homem.”
O presidente do Bears, George McCaskey, recusou respeitosamente uma entrevista para esta história. Em vez disso, através de um porta-voz da equipe, ele me enviou um trecho de quatro páginas do Chicago Bears Centennial Scrapbook, um volume publicado neste verão pelos escritores dos Bears, Don Pierson e Dan Pompei.
Enquanto o trecho do livro não leva o leitor a uma conclusão definitiva sobre o envolvimento de Halas na proibição, os autores certamente não recuam. Estão incluídas as acusações de Pollard e a citação de Halas o chamando de “mentiroso” assim como a constatação de que, apesar de Marshall ter liderado a proibição, “ele não estava sozinho entre os proprietários de equipes”.
Numa crítica mais contundente e honesta do que eu esperava, dado que o livro é um produto da franquia vendido na loja da franquia, Pierson e Pompei escrevem: “Se (a proibição) não era mais que coincidência com a discriminação social predominante da época, os Bears participaram.”
Apreciei o gesto do Sr. McCaskey em fazer a equipe me enviar o PDF. Ele certamente não precisava fazer isso, e reforçou minha impressão de que ele parece um homem decente que trabalha para ver que a organização representa a torcida, a cidade de Chicago e o estado de Illinois com elegância. Ainda estou para ouvir uma palavra ruim sobre ele. Jogadores atuais e antigos parecem respeitá-lo e gostar legitimamente de sua companhia.
Em 2018, McCaskey seguiu a liderança de cinco jogadores do Bears para tornar a franquia a primeira da NFL a maximizar a então recente iniciativa de justiça social da liga, doando mais de US $ 813.000 a cinco organizações de Illinois.
Tudo isso significa que George McCaskey não é o seu avô. Eu queria perguntar a ele sobre isso. Eu queria perguntar a ele se a equipe havia considerado algo diferente de moda quando eles escolheram aqueles retrôs de 1936. Eu queria saber se eles discutiram a desvantagem de usar camisas amarradas a uma única temporada em que seu pai fundador foi fundamental para proibir atletas negros em sua liga.
Repetidas vezes, ouvimos dois argumentos sobre racismo nos dias passados. A primeira é que um determinado símbolo representa apenas o bom, não o ruim. Obviamente, esse sentimento está em jogo no debate aparentemente interminável sobre a bandeira confederada, mas mais pertinente foi o anúncio, neste verão, de lançamento dos tênis Nike com a bandeira dos Estados Unidos de 1776 e o imediato recuo da empresa. Críticas de Colin Kaepernick – cuja própria história tem reflexos de Pollard, Lillard, Kemp e outros – supostamente levaram a Nike a reverter o curso e, literalmente, retirar os tênis das lojas.
Esse é um argumento sobre como tratar o racismo de “época”. Aqui está o outro: “Eu nem estava vivo então! Não tive nada a ver com isso.” Isso é verdade.
No entanto, quando se trata de racismo do passado, a América branca não assobiar e chupar ao mesmo tempo. Não, você não estava vivo naquela época. Não, você não teve nada a ver com isso. Mas outros eram. E outros fizeram.
George Preston Marshall era um desses outros, mas George Halas também era um deles. Assim como seus colegas expoentes da NFL Mara, Lambeau, Carr, Bell, Bidwill e Rooney.
Oito décadas depois, não devemos ter medo de dizer isso.
Jack M Silverstein é historiador do esporte de Chicago, historiador do Chiago Bears no Windy City Gridiron e autor de How The GOAT Was Built: 6 Life Lessons From the 1996 Chicago Bulls. Ele é o proprietário do Instagram “A Shot on Ehlo” sobre a história do esporte de Chicago. Diga olá em @readjack no twitter.