O novo Colts de Chris Ballard

Antes de começar, vamos relembrar a chegada de Chris Ballard no Indianapolis Colts. Ballard era da comissão de scouting do Kansas City Chiefs e havia sido contratado para o cargo de GM dos Colts após o péssimo trabalho feito por Ryan Grigson à frente da franquia. Chegou para a temporada de 2017 onde havia uma incógnita sobre o futuro de Andrew Luck, astro da franquia.

FORA DAS QUATRO LINHAS

Em seu discurso de chegada, Ballard deu sinais de que as coisas precisavam mudar. Não somente dentro do campo, mas também a filosofia da franquia. Os Colts contavam com um dos melhores QBs da NFL, Andrew Luck, porém havia muita incerteza se ele voltaria a jogar visto que tinha ficado de fora a temporada anterior com uma grave lesão no ombro.

Ballard sempre manteve uma postura respeitosa e de caráter trabalhador. Sempre evitou polêmicas e trabalhou com seriedade. Suas entrevistas não tinham meias palavras. Era objetivo e procurava sempre ser cordial, tanto com jogadores e membros da franquia quanto com a comunidade. A prova disso é que Ballard ganhou em 2020 o PFWA Jack Horrigan Award, dado ao membro da liga ou de um clube por suas qualidades e estilo profissional para ajudar os profissionais da imprensa a fazerem seus trabalhos.

Segundo Mike Chappell, jornalista que cobre os Colts desde 1984, Ballard sempre se mostrou muito profissional. Evidenciava-se a sua responsabilidade para com os membros da imprensa, entendendo o trabalho que a mídia precisa fazer.  Ballard já havia sido nomeado para receber o prêmio nos dois anos anteriores.

No entanto, os momentos passíveis de admiração a Chris não param por aí. À época em que acertou contrato com os Colts, foi revelada uma história muito emocionante da família de Ballard. Em uma matéria feita por Bob Kravitz, descobrimos como Ballard e sua esposa salvaram a vida de quatro garotas que passavam por situação de vulnerabilidade devido a dependência química da mãe.

Segundo a matéria, Ballard e a esposa Kristin já tinham três filhos e se depararam com uma família em situação precária. Segundo a fonte da matéria, a mãe (Jane) era viciada em drogas e mantinha os quatro filhos (Skylar, Angel, Sunnie e Rainn) em casas onde era feito o uso das substâncias ilegais. Lá elas passavam fome, sede, frio e lidavam com vivências deploráveis.

Depois de um tempo, Ballard e a esposa adotaram duas das crianças (Sunnie e Rainn) e as outras duas foram adotadas por outras famílias. Ainda de acordo com Chappell, alguns profissionais da saúde entraram em consenso que o melhor era separá-las para cuidados mais individualizados. Segundo eles, em entrevista concedida para a matéria, não era uma escolha difícil, era algo que eles tinham condições de fazer e queriam fazer. Pelas palavras do próprio Ballard “há muitas crianças que precisam de amor e orientação neste mundo e se somos capazes, precisamos fazer tudo que é possível para ajudá-los. Eu era uma dessas pessoas”.

Claramente o senso de sociabilidade de Ballard ultrapassa os campos da NFL. Sua história de vida pessoal demonstra o caráter e sua visão de coletividade, além da busca incansável por agir corretamente.

Recentemente, com as manifestações após o assassinato de George Floyd por um policial branco, Ballard deu uma entrevista online onde disse que as semanas que se sucederam ao caso foram uma das mais impactantes de sua vida. Os dias que sucederam o assassinato de Floyd foram de diálogo. Ouvindo depoimentos e reflexões do grupo de jogadores e da comissão, além dos depoimentos dos representantes do movimento na mídia. Toda a situação fez com que mudasse seu pensamento sobre a luta do movimento preto.

O GERENCIAMENTO DA FRANQUIA

Ao assumir o cargo de GM dos Colts, Ballard estava assumindo uma franquia com um grande QB e alguns lampejos de talentos em diferentes posições (T.Y. Hilton, Ryan Kelly, Anthony Castonzo). O ponto de partida já demonstrava um grande desafio por si só. Não bastasse isso, sua principal estrela estava fora de ação há meses por conta de uma lesão grave no ombro, colocando em cheque sua volta aos gramados. Na temporada de 2017 (ainda sem Andrew Luck) os Colts tiveram que mudar sua postura e seu pensamento. Ao chegar, Ballard deixou claro algumas de suas convicções:

  1. Quanto melhor forem suas linhas (defensivas e ofensivas) mais competitivo será seu time;
  2. Ele iria montar a equipe de modo que houvesse disputa de posição entre os jogadores de forma saudável, indicando que ninguém teria lugar cativo no time;
  3. Não haveria espaço para jogadores que não pensassem no coletivo do time. Demonstrações de caráter seriam importantes a partir de sua chegada para a seleção de quem teria o privilégio de estar na equipe.

Outro grande problema a ser solucionado era a posição de HC da equipe. Chuck Pagano já vinha de anos de trabalhos ruins e foi demitido logo após a primeira temporada de Ballard no comando da equipe. A demissão não causou nenhuma surpresa, visto que Pagano já deveria ter saído do time há pelo menos dois anos, na opinião de boa parte da imprensa e dos torcedores.

Durante os playoffs da temporada de 2017 (para os quais os Colts não haviam se classificado) o novo GM entrou em contato com Josh McDaniels, atual OC do New England Patriots e candidato cobiçado por vários times para assumir o cargo de Head Coach. McDaniels deu sua palavra aos Colts e posteriormente voltou atrás, recusando a oferta que já havia aceitado. Contamos aí o primeiro revés de Ballard à frente da franquia. Ele lidou com a situação de forma plena e sem meias palavras. Concedeu entrevista coletiva dizendo que perguntou a McDaniels se ele estava “no barco” e com a resposta negativa, encerrou os contatos com o técnico.

Algumas semanas depois acabou contratando o OC dos Eagles, Frank Reich, que havia conquistado o Super Bowl LII. Vale lembrar que Frank havia declinado qualquer conversa sobre contratações até a final, preferindo focar no jogo mais importante da temporada. Ao assumir o cargo montou um staff com algumas pessoas de sua confiança e hoje vemos que essa foi a melhor coisa que poderia ter acontecido.

Depois de uma boa temporada de 2018, onde o time saiu de um recorde 1-5 para 9-1 nas últimas 10 rodadas da temporada regular, os Colts garantiram vaga nos playoffs. Venceu os Texans fora de casa na rodada de Wild Card, mas perdeu para os Chiefs do MVP Patrick Mahomes. Ballard mostrou a que veio e era nítida a evolução do time sob seu comando.

Para a temporada seguinte, Ballard se preparou e montou um time ainda mais forte, colocando sua filosofia e convicções em prática. Andrew Luck havia voltado aos gramados jogando novamente em alto nível, tínhamos uma boa OL e um coaching staff se mostrando capaz de elevar o nível do time. Parecia tudo certo para buscar voos mais altos na temporada de 2019, no entanto veio o segundo revés.

Semanas antes da temporada começar, Luck decidiu se aposentar, deixando o comando do ataque nas mãos de Jacoby Brissett. Como sabemos, o QB não conseguiu explorar todo o potencial do time para brigar por algo maior na temporada. Ainda assim, o time terminou a temporada com 7 vitórias e 9 derrotas.

Em três anos à frente da franquia, Chris Ballard já teve que lidar com: demissão e contratação de um novo HC às pressas após ter sofrido um “calote”, a aposentadoria repentina do seu franchise quarterback e o fardo de gerenciar um péssimo elenco deixado pelo GM anterior.

DENTRO DO JOGO

Os GMs são acostumados a lidar com adversidades, no entanto, não vemos com frequência no mundo da NFL o que aconteceu com Ballard no comando dos Colts. Saber se virar em meio ao caos tem sido uma das grandes virtudes mostradas pelo atual comandante da franquia de Indianapolis. Apesar de tudo isso ainda se faz necessário montar um time competitivo com as armas que tem em mãos. E aqui falarei sobre uma das principais virtudes de Ballard no comando dos Colts: o Draft! A atuação no recrutamento é provavelmente uma das maiores qualidades de Chris. Não a toa, foi eleito dois anos seguidos como o melhor avaliador de talentos entre os GMs da liga. A pesquisa, que aconteceu pela segunda vez, é promovida por Ben Standig, do The Athletic.

Quando chegou, em 2017, os Colts tinham a escolha a 15ª escolha geral daquele ano. Havia muitos prospectos interessantes e Ballard precisava agregar talento e elevar o nível de uma franquia que na década passada foi detentora de grandes resultados no comando de Peyton Manning. Com o passar do Draft, um dos melhores prospectos começou a cair por conta do histórico de lesões. Malik Hooker e Jamal Adams eram os mais talentosos na posição de safety e, segundo os mock drafts da época, cotados para sair nas primeiras escolhas gerais. Apesar das dúvidas quanto à saúde de Hooker, Chris Ballard selecionou o jogador de Ohio State. Ainda naquele Draft chegaram aos Colts jogadores como o RB Marlon Mack, o LB Anthony Walker Jr. e o DT Grover Stewart. Todos os três jogadores permanecem no elenco e são peças fundamentais da equipe.

No ano seguinte, após uma péssima temporada, os Colts selecionariam na terceira posição geral do Draft. No entanto, Ballard negociou a escolha e fez um trade down com o New York Jets. Cedendo a escolha Top 3 que se tornou no QB Sam Darnold para os Jets, os Colts saíram do Draft com a escolha #6 (G Quenton Nelson), #37 (RT Braden Smith), #49 (DE Kemoko Turay) mais uma seleção de segunda rodada do Draft seguinte, que se tornou no LB Ben Banogu.

Embora os Jets tenham selecionado seu FQB a comunidade da NFL de modo geral concorda que essa troca foi muito favorável aos Colts. O G Quenton Nelson, em dois anos na NFL foi First-Team All-Pro duas vezes, e está há 30 jogos consecutivos sem ceder um sack. Braden Smith foi draftado como G mas devido as seguidas lesões na posição de RT do time, o calouro assumiu a titularidade e hoje forma o quinteto titular de uma das melhores OL da NFL.

Kemoko Turay se lesionou no segundo ano depois de demonstrar muito potencial como calouro. Para 2020 é cotado pela comissão e pela imprensa que cobre os Colts nos EUA como o jogador com potencial para explodir na temporada. O LB Ben Banogu vem com grandes expectativas para a temporada de 2020 visto suas atuações em 2019.

No Draft de 2019 Ballard mais uma vez optou por um trade down, agora com o time de Washington. Saíram da escolha #26 para a escolha #34 onde selecionaram o CB Rock Ya-Sin: jovem talentoso na posição, que evoluiu na temporada de calouro e que poderá ser muito útil ao time mesmo após algumas atuações ruins (como contra o Denver Broncos). Posteriormente, chegaram jogadores como o WR Parris Campbell, o LB Bobby Okereke, o S Khari Willis, o CB Marvell Tell e o LB EJ Speed. Todos permanecem no elenco e de uma forma ou outra, já mostraram seus potenciais, destaque especial para o Okereke e Willis.

No Draft de 2020 tivemos uma surpresa. Após uma frustrante temporada, os Colts eram donos da escolha número 13 e, como havia demonstrado até então, Ballard não é o tipo de GM que troca sua primeira escolha a não ser que acumule outras escolhas de Draft. No entanto, os Colts trocaram sua escolha de primeira rodada com o San Francisco 49ers pelo DT DeForest Buckner (Second-Team All-Pro em 2019). A justificativa dada para o movimento foi de que os Colts necessitavam de um jogador com as características de Buckner para compor sua linha defensiva.

Relembrando que, para Ballard, a composição das linhas é o que difere a competitividade de seu time. A OL dos Colts já é uma das melhores da NFL e com a aquisição de um jogador que tem ótimos números e ótimas atuações a expectativa é grande que a DL mude de patamar em 2020. Nesse ponto é válido ressaltar que existe muito estudo para as escolhas no Draft, no entanto, ainda é extremamente raro encontrar dois ou mais jogadores que irão realmente acrescentar ao time como vem acontecendo com as escolhas do GM dos Colts.

Ainda no Draft de 2020 vieram jogadores como o WR Michael Pittman Jr de USC e o RB Jonathan Taylor, ambas escolhas de segunda rodada. Taylor está sendo cotado como um dos principais candidatos a calouro ofensivo do ano da NFL, visto que irá correr atrás de uma das melhores OLs da NFL. Desde a temporada anterior o time mostrou que pode dominar o adversário por meio do jogo terrestre. E agora é comandado esse ano por um QB que pode ameaçar a defesa adversária lançando a bola.

Todos os anos de Ballard a frente dos Colts nos Drafts fizeram o nível do time subir e se tornar um dos mais competitivos da NFL enquanto tínhamos um Elite QB, o que foi provado em 2018 com apenas dois anos no comando.

NEM TUDO SÃO FLORES…

Apesar de todos os elogios feitos aqui, nem tudo são flores para sua atuação frente a franquia. Particularmente (aqui é uma opinião pessoal como torcedor e amante da NFL) há ainda um aspecto que deve ser considerado e que poderia ser melhor.

Ballard deixou bem claro que seu time será construído via Draft, o que é imprescindível. No entanto, a free agency da NFL ainda é uma época importante onde se deve e se pode elevar ainda mais o nível do seu time. Particularmente, vejo no Ballard uma certa precaução excessiva em não assumir grandes riscos no mercado da NFL. Desde que chegou, o cap space do time é sempre um dos maiores da liga, muito pela falta de talento no time, que gera pagamentos mais baixos aos jogadores.

Houve momentos nesses anos em que sua atuação na FA poderia ter sido mais agressiva. Trazendo jogadores que poderiam elevar o nível do time em contratos de curta duração sem tanto risco. Um exemplo disso foi a contratação de de Justin Houston, uma bela aquisição. Por vezes era possível perceber que os Colts necessitavam de jogadores de um nível mais alto para competir e não o tinham por conta da não agressividade nas negociações.

Isso significa que ele deve participar dos leilões por jogadores na FA e pagar fortunas como anualmente acontece? A resposta é “depende”. Existem jogadores que valem o preço que é pago e se você pode pagá-lo, deve fazê-lo. A impressão que fica é que um time demora mais para ser competitivo e que já poderia ser com mais agressividade na free agency. Recentemente temos exemplos de times que fizeram isso e trouxeram resultados positivos, o caso do Philadelphia Eagles e Los Angeles Rams.

Cito isso por tudo que Ballard tem entregue para o Colts nesses últimos anos. A avaliação dos jogadores, a gerência do time e a construção do elenco são muito boas. Não há dúvidas que a sua avaliação de jogadores é boa. O que travou por diversas vezes essa agressividade foi o dinheiro a ser pago. E convenhamos, para uma franquia da NFL que tem folga no salary cap (que é o caso dos Colts nesses últimos anos) dinheiro nunca foi problema.

CONCLUSÃO

Está claro que a chegada de Ballard para o cargo de GM dos Colts mudou o time de patamar, mas não somente isso. Com o passar dos anos no cargo, pudemos observar uma mudança de filosofia. Não só no time em campo, mas na franquia como um todo.

Recentemente os Colts anunciaram através de suas redes sociais e site uma série de medidas dentro da franquia em prol do combate ao racismo e preconceitos contra minorias. Uma das ações é a criação de um departamento de inclusão social de modo efetivo e integral. Além disso decretaram o dia 19 de Junho como feriado para a franquia (a data marca oficialmente a abolição da escravidão nos EUA).

Olhando para o time e para as entrevistas dos jogadores e membros da comissão, há respeito mútuo entre os jogadores. O OC Nick Sirianni, em entrevista pós-Draft, falou que conversou com Marlon Mack após a escolha de Jonathan Taylor sobre ambos trabalharem juntos. O RB titular do time respondeu que que estava empolgado em trabalhar com Taylor, demonstrando que está pensando no coletivo e não no individual. Há inúmeros outros exemplos que poderiam ser citados por aqui. No entanto, a essa altura do texto acredito que todos tenham entendido o meu objetivo com este artigo.

Chris Ballard iniciou uma importante mudança de rumos no Indianapolis Colts. A sua chegada e a contratação de um grupo de profissionais que entende o lugar que estão, foi de suma importância para essa mudança na franquia. Tornou-se clara a concepção de que o time é uma entidade integrante de um contexto social muito maior que o futebol americano ou a NFL.

 


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